Numa
quarta-feira chuvosa, ao olhar mais um processo de homicídio e as
‘peças jurídicas’ nele inseridas, não me contive e lanço: é certo
apregoar essa máxima de ‘princípio da verdade real’ em processo penal?
Sinceramente...
sem blá blá blás de juridiquês nacional ou estrangeiro, sem sofismas ou
verborragias pretorianas... sem invocar J.J. Canotilho, Ronald Dworkin
ou R. Alexy... não!
A
verdade constatada é que no mundo jurídico (que muitos pensam,
acreditam e idolatram como um mundo a parte), sobejam formalidades que
se sobressaem ao mundo real.
Prevalece,
na sistemática normativa e visão mecanicista do mundo processual penal
(não adentrarei no cansativo René Descartes, fique tranquilo!), a
verdade processual!
A busca da verdade real é apenas e tão somente almejada... mas prevalece ‘o que está no mundo dos autos’ (‘quod non est in actis non est in mundo’, diriam os adoradores do latim).
Toda essa reflexão me veio já na peça de defesa, a tal ‘defesa preliminar’.
Não obstante o réu ser confesso do assassinato (‘matei porque ele não cumpriu o acordo’ de uma dívida) e as testemunhas disserem que ‘ele chegou de moto e sem que a vítima visse, desferiu vários tiros contra ela, matando-a no mesmo local’, a defesa põe: ‘será demonstrado que a denúncia não retrata a verdade dos fatos e que o réu deverá ser absolvido’...
Detalhe:
o réu está foragido e a defesa técnica fora nomeada e agiu no popular
‘pró forma’ ou, em outras palavras, não conversou com réu ou qualquer
pessoa e mandou um modelão genérico... na busca da verdade... verdade
real?
Quantas
não foram (e são) as vezes em que, na data do julgamento do Tribunal do
Júri, uma das partes (acusação ou defesa), surge com provas que lhe
foram acessíveis somente na véspera ou mesmo na data do julgamento, mas
referida prova não pode ser utilizada, ante a vedação do art. 479 Código
de Processo Penal, que impede sua apresentação aos jurados se não
oportunizada vista à parte adversa, em três dias antes da solenidade em
plenário?
Detalhe: está se julgando uma pessoa e, vale lembrar, um assassinato... a retirada da vida de uma pessoa!
Verdade real?
E
o que dizer da proibição de leitura, aos jurados, das decisões do juiz,
que determinaram seu julgamento, ou mesmo do Tribunal de Justiça, que
estabeleceu haver indícios de autoria contra o réu?
Os
jurados, que serão os juízes e deveriam ter conhecimento de todos os
elementos ligados ao caso, são impedidos - pela lei - de uma leitura...
mas a lei estabelece a entrega de tais decisões a eles... ah??
Isso mesmo: ler pode, ouvir outro ler, não!
Franz Kafka, Lewis Carrol, Alan Poe ou Herman Hesse não poderiam pensar em algo mais surreal e... nada a ver!
Também não é possível fazer referência à decisão do juiz, que determinou o uso de algemas ao réu!
Ou
seja, você tem que julgar o fato, o qual é carregado de cunho subjetivo
(dolo, culpa, intensidade, freios, ânimo, estado psicológico, etc) mas
não pode saber se ele foi algemado por levar a perigo terceiros ou a si
próprio, etc...
Verdade real? Valha!
Bom, por hoje está bom, já que a verdade real é que a chuva não acaba e os processos e mortes também!
Fica
o alerta aos estudantes de Direito... já que o ‘copia e cola’ está
arraigado nos livros jurídicos... e o efeito manada (um segue o
outro..sem pensar) também!
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